segunda-feira, 18 de julho de 2011

Pedestre ou motorista?

Hoje pela manhã, num programa de rádio, houve muitas reclamações contra a recente instalação de um semáforo localizado em uma cidade circunvizinha a Salvador. Pessoas se queixavam do longo engarrafamento provocado pela mudança ocorrida no tráfego, descerrando todo tipo de agravo à prefeita de lá.

O engraçado é que nenhum pedestre ligou reclamando. Imagino que, de algum modo, a instalação tenha sido em benefício destes. Até porque, que eu entenda, políticas públicas são prioritariamente voltada às pessoas, e não para os carros. Porque antes de ser motorista ou ter um carro, todo mundo é pedestre. E antes de ser pedestre, todo mundo é cidadão. Mas a gente se esquece disso.

As mesmas pessoas que criticam a crise de valores pela qual passamos são as primeiras a reclamar em favor próprio, isto é, em favor de suas máquinas. Exemplo é que, numa das ligações, ao se queixar dos desgovernos públicos ante a mobilidade urbana, um ouvinte relatava a dor que ele sentia, e ele disse assim mesmo - "como dói" -, quando o carro novo dele passava por um buraco.

É que o cidadão é a própria máquina, coisificado pelo capital, que inverte a lógica e nos desumaniza, fazendo com que o sentimento de existência venha pelos objetos. Objetos que supostamente nos fazem ser sujeitos. Objetos que nos conduzem às queixas como consumidores insatisfeitos, apenas consumidores. Mas a gente se esquece disso.

Haja esforço para se manter humano, demasiadamente humano. Também quero exercer a cidadania; vamos tentar? Talvez, na situação de motorista, eu ficaria p... da vida. Só que compreendo muito bem como é o risco de atravessar na faixa de pedestre, abaixo do redundante semáforo vermelho a indicar nosso direito. Pois, ainda assim, motoristas vêm desgovernados, apressados e cheios de si, empoderados pelo ronco de seus enfurecidos motores.

Aprendemos desde criança a olhar para os dois lados ao atravessar a rua. E por que não aprendemos a olhar para os dois lados diante de um fato? Nunca se sabe quem vem de lá, mas podemos imaginar como é estar na pele do outro. Nesse caso, aquele sujeito-pedestre ali, que precisa caminhar até a próxima calçada, em seu digníssimo direito, talvez tendo a mesma pressa que você para chegar ao local de trabalho e, enfim, bater seu ponto são e salvo. Mas a gente se esquece disso.



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8 comentários:

  1. Eu estava na mesma sintonia sua. Ouvimos as mesmas lamentações. Teve um sujeito que até agradeceu à digníssima prefeita por mais um engarrafamento.
    O fato é que após ler o seu "post" fiz uma reflexão sobre o assunto e ví que tenho opiniões dúbias. Do ponto de vista de condutor de veículos, realmente fico indignado com os engarrafamentos em Salvador. Principalmente porque as distâncias são longas e o tempo para percorrê-las muito curto. E tenho também a visão de pedestre e sei como é complicado as vezes estar atravessando uma rua e me deparar com um veículo em cima da faixa de pedestres. O fato é que a instalação de sinaleiras em vias expressas deve gerar um ganho muito grande para os governantes, uma vez que a corrupção é muito grande e a necessidade de manutenção é necessária e constante.
    A instalação de passarelas pra pedestres seria muito mais inteligente, mas o ganho dos governantes é menor. Sem contar que mesmo tendo uma passarela o pedestre continua atravessando as ruas, o que também podemos considerar uma ignorância dos pedestres.
    O problema tá aí e precisamos de solução, creio que a educação de motoristas e pedestres seria uma saída. E tenho dito...

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  2. Pois é, Nando. Mas todas as ruas teriam passarelas? E tudo isso por conta do enorme aumento da quantidade de carros, que vão e vêm sem querer parar alguns minutos.
    A educação também tem sua pressa e sua necessidade é amiúde jogada ao segundo plano.
    De fato, é preciso repensar as atuais políticas de mobilidade urbana. Penso eu que as pessoas têm de vir em primeiro lugar; sempre. Acredito que não adiantará transformar nossa cidade já mal planejada urbanisticamente numa grande via expressa...

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  3. Mesmo que houvesse um semáforo para cada condutor e uma faixa para cada andarilho... ainda faltará um sinal de gentileza nessa via. Até quando?!

    Beijo e te amo!

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  4. Mesmo que houvesse um semáforo para cada condutor e uma faixa para cada andarilho... ainda faltará um sinal de gentileza nessa via. Até quando?!

    Beijo e te amo!

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  5. Nine, excelente o seu comentário. É a falata do senso de coletividade que nos faz esquecer nossa condição de cidadão, antes da de consumidor ou proprietário. Viver na Bahia (e falo daqui porque é onde vivo) é uma selvageria!

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  6. Texto EXCELENTE. Estamos sucumbindo à nossas próprias máquinas. E nem são robôs com inteligência artificial.

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