terça-feira, 14 de dezembro de 2010

A rede dos brinquedos


Final de ano, ruas escoando gente para todo lado, shoppings superlotados. Metade do tempo você gasta a encontrar uma vaga de estacionamento. Em meio a tudo isso, fui ajudar meu pai na compra de uma "lembrancinha" para meus sobrinhos. Nunca imaginei que fosse tão difícil: não há nada abaixo de 50 reais. E eu que achava que redes só de pesca, internet, supermercados, profissionais e sociais, percebi que também há a rede dos brinquedos.

Isto é, quando se encontra um brinquedo menos caro, você ainda descobre que é obrigado a comprar pelo menos mais cinco. A turma do Shrek aumenta cada vez mais: só na primeira gravidez da Fiona, vieram mais três ogrinhos! O pessoal do Toy Story também só vem de galera. E o Ben 10, a nova sensação do momento, transforma-se em mais de vinte alienígenas (Fantasmático, Besta, Insectóide, Ultra T, Normossauro... e por aí vai). O grande problema é que, como nós, cada um está no seu quadrado, ou melhor, no seu pacote.

Por fim, a questão: são mesmo brinquedos?

Onde antes fantasiávamos situações pertinentes às nossas identificações familiares, agora incorporamos modos de pensar, agir e brincar impostos por quem também se ocupa de nossa educação: a mídia comercial - televisiva, cinematográfica e cibernética.

Está claro que nossas atuais brincadeiras mimetizam a cultura da indústria da infância, que introjetamos via desenhos animados, jogos, filmes, publicidades e propagandas. Desde quando eu era criança já era assim; só mudavam as personagens. Eu já brinquei com bonecos da turma do Gulliver, He-man, Thundercats...

Mas, ao menos, pude brincar nas ruas, correndo e interagindo com meus vizinhos. Será que as crianças de hoje ainda aceitariam um iô-iô? Um pião? Umas bolinhas de gude?

Ou será porque não têm companhia para brincar, já que os pais trabalham diuturnamente, são filhos únicos, com vizinhança estranha e alheia, além de morarem em locais inseguros (apesar de alguns com vigilância)?

Sobre motivos preocupantes, abaixo segue trailer do documentário Criança, A Alma do Negócio, de Estela Renner e Marco Nisti, que diz do efeito da publicidade comercial no comportamento e nos valores das crianças (clique neste link para vê-lo na íntegra).





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segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Sim, o nordestino também pode!


Todo nordestino que tem e-mail deve ter recebido mensagens divulgando o movimento contra a xenofobia pós-eleição que tomou conta do ciberespaço brasileiro na semana que passou, diante da expressão dos votos para presidente mapeados em nosso território.

Eu, como baiana e nordestina, fiquei indignada com as palavras nefastas que li de tantos twitteiros! Respirei fundo, contei até dez, até cem... sem, no entanto, querer esquecer ou apagar as frases que ecoavam dentro de mim. E me pus a refletir sobre as razões e as repercussões dessas atitudes repugnantes, que algumas massas acabam por reproduzir diante de questões adversas à própria vontade.

Penso que o brasileiro em geral aprendeu - junto com os políticos que os representa - que quando não há argumentos, apela-se à destruição moral da outra parte... Por isso, venho aqui descerrar alguns pontos, de modo a construir um diálogo, evitando o maniqueísmo e o ódio polarizado que nos toma em horas assim.

Primeiro, pensei por que xenofobia? Desconfiada do termo, fui ao Houaiss e lá confirmei: "desconfiança, temor ou antipatia por pessoas estranhas ao meio daquele que as ajuíza, ou pelo que é incomum ou vem de fora do país". Etimologicamente, tem origem grega: xénos = estrangeiro; phóbos = temor.

Acaso somos tão, mas tão estranhos, que nem brasileiros somos? Tsc, tsc... a boa intenção acabou me atingindo num duplo preconceito! Pois, para mim, é disso que se trata: desde que o mundo é mundo, existe o preconceito, cujo assunto rende muitas linhas e rios de tinta de discussões.

Segundo, a defesa que aqui proponho não procura responder na mesma medida, sobretudo porque retroalimentaria as diferenças nacionais de modo irracional. Eu até poderia ser bairrista e justificar com várias dimensões de nossa cultura, valorizando a nação norte-nordestina para além da pobreza e analfabetismo que tanto nos assola e que tanto ajuda a ratificar a visão estereotipada que foi construída histórica e culturalmente nos gerais do Brasil.

Como numa espécie de renovada Idade Média, com o perdão do trocadilho, vivemos uma Idade Mídia, cujo saber e olhar sobre a vida reproduz as trevas que se mantêm junto com certas ideias discriminatórias, preconceituosas e, por que não, racistas. Diante disso, o ambiente virtual torna permissível disseminações, anônimas ou corajosamente assinadas, ativadas por nossa pior parte humana, demasiadamente humana.

Essas coisas me põem a problematizar nossa ética diante de determinadas situações. Nós adoramos ser a favor ou contra alguma coisa, principalmente contra. Compomos o homem midieval, velado por avatares e nicknames, com uma postura que permanece ainda eugênica, higiênica e hipócrita.

Longe de ser politicamente correta ou moralista, penso que perdemos nosso respeito e solidariedade ao próximo. Isso é crítico. Será que nós, nordestinos, sudestinos, sulistas, paulistas ou tribalistas, somos tão melhores, uns em relação aos outros, que não aceitamos a orientação alheia à nossa? Vamos importar a dicotomia norte-americana de vencedores e perdedores?

Aceitar a vontade da maioria é um princípio democrático. Tal qual é imperativa a condescendência civilizada sobre a nossa condição amplamente diversa de culturas, sotaques, cores, sabores, músicas, religiosidades, sexualidades, entre outras. E quanto às nossas escolhas, independente dos argumentos econômicos ou político-sociais que podem subsidiar o entendimento sobre os resultados dessa eleição, fato é que elas foram de livre e espontânea vontade do povo, o qual majoritariamente representa seu relativo poder. Sendo assim, por essa brecha, no esteio do presidente estadunidense Barack Obama ("yes, we can") e de nossa futura presidenta Dilma Rousseff ("sim, a mulher pode"), aproveito para dizer que os nordestinos também podem!




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segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Pisando nos 'santinhos'!


Sábado, assistindo ao Jornal Nacional, eu até me comovi com a reportagem dos bastidores da última semana de campanha dos presidenciáveis - particularmente Dilma, Serra e Marina. As matérias pretendiam mostrar os desafios dos candidatos em percorrer este nosso vasto território, a fim de alcançar suas metas de eleitorado. Serra e sua família, Dilma e os quilos a mais, Marina e os quilos a menos. Se bem que de jatinho todo santo ajuda, né não?

E falando em santos, pelo que pude ver ontem, ao justificar meu voto aqui em Salvador, teve muita boca de urna ocorrendo descaradamente às portas dos locais de votação... E, é claro, muitos santinhos sujando as ruas. A vantagem é que, ao menos nessas horas, a gente pode estar por cima de certos políticos, pisando literalmente em suas propostas e em seus sorrisos de caras de pau!

Ocorre que ainda estamos adolescendo no processo democrático. Penso que a resposta de um segundo turno nos dá notícia de que os conflitos de ideias e propostas devem continuar, sobretudo, de que isso é um sinal de democracia, para além de outras coisas que nos travam em seu avanço...

Por exemplo, eu gostaria muito de ver um debate dos marqueteiros que ficam velados pelas belas edições de imagens televisionadas e nos belíssimos discursos de compromissos proferidos em palanques e mídias audiovisuais! Afinal, falar em promessa está fora de moda neste nicho, ficando reservado às negociações entre os verdadeiros santos e seus devotos fiéis!

Acho que iríamos nos esbaldar em ver como seriam as discussões entre eles: de onde eles retiram as ideias perversas que um discurso pode esconder através dos favores propagados e relatados pelos sorrisos sem dentes dos "favorecidos", bem diferentes daqueles dos santinhos, ao invés de ouvirmos sobre seus direitos garantidos durante o pleito de presidentes e governadores.

Felizmente, o eleitor está mudando, mesmo que paulatinamente, mas está. Vejamos a resposta de Marina diante das urnas, promovendo o segundo turno. De modo que me permitiu, inclusive, divagar: será que Dilma conquistou os quilos perdidos de Marina? E Marina, por sua vez, será que conquistou os votos que eram de Dilma?

Entre piadas e santinhos de papel, o que importa é aproveitar este momento e, mais uma vez, repensar ou reafirmar nossas vontades políticas.



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segunda-feira, 12 de julho de 2010

A massa crê no massacre.


Conversando com amigos, falávamos da proliferação de abusos musicais e culturais que se propagam via rádios, tvs e milhares de mptrês, quatro ou dez no mundo afora... Sem falar nas caixas de som automotivas que ecoam pela cidade, apesar das leis. Não queríamos ser nostálgicos, mas discutíamos que - praticamente - estamos sendo obrigados a gostar da pasta empurrada goela abaixo pela nossa indústria cultural.

Não bastasse sairmos de saia, na bicicletinha, com uma mão no guidão e outra na calcinha, dançando o rebolation e clamando por ei, psiu, beijos, me liga como um meteoro da paixão, temos sido obrigados a conviver com os sons ensurdecedores que massificam uma programação musical de escolha duvidosa (o famoso "jabá")! Eu, por exemplo, já não aguento mais ouvir pá-rá-rá na voz de Silvano Sales, mas sou obrigada, pois entra forçadamente pela minha janela...

Diante de tantas liberdades de expressões culturais, afinal, onde está a criatividade melódica e poética que tanto caracteriza(va) nossa música brasileira?

Por isso, para além de criticar a forma e o conteúdo, quero questionar para onde vai a nossa cultura musical. É este mesmo o nosso retrato? Importaremos a redução mundial ao pop e suas variações: pop-rock; pop-axé; pop-reggae; sertanejo pop? (Lembrei de um vídeo muito divertido e ilustrativo sobre esta questão: Four Chords - legendado).

É claro que temos uma oferta diversificada e bastante interessante. Só que em relação à grande massa - onde, de certa forma, estamos todos incluídos -, inexoravelmente chegaremos ao mais do mesmo. Produzindo ídolos bonitinhos, com suas golas V, de corpos bombados e hipertatuados, tentando quem sabe disfarçar o esvaziamento de suas musicalidades criativas, ao passo em que evitam brincadeiras sonoras que poderiam de fato nos levar à arte de verdadeira criação e produção.

E é brincando com as palavras que concluo com uma triste constatação: a massa crê no massacre. Eu é que me recuso.


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terça-feira, 18 de maio de 2010

Ai, meu Deus, eles querem me alienar!


Parodiando a personagem shakespeareana: "televisão: ver ou não ver, eis a questão"!

Eu não sei o que é pior; se é viver no mundo alheio às notícias ou ouvi-las nos telejornais acompanhadas de opiniões estapafúrdias! Só sei de uma coisa sobre as posições: ambas alienam!

Hoje pela manhã assistindo um jornal na TV, vi a notícia de uma morte trágica ocorrida ontem aqui em Salvador. Um homem morreu atropelado por um ônibus, cujo acidente foi causado por ele próprio ao se jogar na frente do veículo. De acordo com as informações e entrevistas colhidas, ele sofria de transtorno mental há longo prazo. Segundo um familiar: "Ele fazia tratamento psiquiátrico, tomava remédio e tudo... Era esquizofrênico, [sendo até] diagnosticado por um médico da universidade!"

Após essa edição parcial sobre a questão, em seguida, a apresentadora comenta mais ou menos assim: Que muita gente discorda e não gosta de falar no assunto, mas isso tudo seria falta da crença em Deus. Que era preciso repensar a Reforma Psiquiátrica, porque desse jeito não dava. E que ela entendia que existia muito preconceito acerca do assuntos "mentais" etc., mas coitada dessa família que teria de conviver com a culpa e o sofrimento de não ter conseguido segurá-lo em casa!

Imediatamente eu enviei um e-mail ao programa contestando a posição da apresentadora, colocando que, inclusive, coincidentemente, hoje é Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Há 23 anos, em 18 de maio de 1987, ocorria a Primeira Conferência Nacional de Saúde Mental, a qual propôs uma reforma no modelo de assistência a portadores de transtornos mentais, com atendimento extramuros hospitalares, com a tentativa de inclusão social e familiar, privilegiando os direitos sociais e sua cidadania. Mas não foi incluso na pauta. Por quê?

Falar de tragédia todo mundo quer, até porque rende assunto e a gente pode sair acusando livremente quem bem queremos; de políticos a funcionários públicos, de reformadores (revolucionários) sociais às "famílias desestruturadas" pelas mazelas cotidianas! Blá, blá, blá.

Ora, é papel da imprensa colaborar com essas discussões necessárias à sociedade, porém, de modo que possamos repensar nossas práticas sociais de inclusão, evitando as discriminações sociais e os rótulos negativos que muitos detêm. Sobretudo, evitando reforçar tachativamente as doenças e formas diferentes de existência...

E quando eu pensava que acabava por aí, segue-se outra notícia. A de que a Prefeitura Municipal de Salvador lançou o cartão municipal de saúde, buscando facilitar e melhor controlar o acesso aos atuais dispositivos existentes - marcação de consultas, controle de vacinação, dispensação de medicamentos etc. O prefeito João Henrique foi o primeiro a se inscrever no programa. E justifica em entrevista: "Essa é uma maneira de ampliar o acesso àqueles que não podem pagar um plano de saúde privado"!

Como assim? Que distorção é essa! Ele não fez mais do que tentar cumprir um dever. A saúde é um direito constitucional que deve ser garantido pelo estado. Isto é, uma vez que não se tem garantido a todos, os planos privados é que são complementares para quem pode pagar... Mas o prefeito parece querer me convencer do contrário!

Ai, meu Deus, eles querem me alienar! Sem evitar o tema e o trocadilho com o dia de hoje, essa sociedade é que nos deixa assim, mas eu não quero e nem permito. E quanto mais lúcida, mais louca eu fico...




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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Nunca antes...


Da sombra do poste, voltando para casa, eu li a seguinte frase num outdoor: "Nunca se trabalhou tanto na Bahia". 

Hã? 

Então, logo abaixo, com letras menores, estava escrito: "Mais de 170 mil empregos gerados...", blá, blá, blá. Ah, bom! Trata-se da nova peça publicitária do governo do estado que vem sendo veiculada em todas as mídias - rádio, TV e impressos...

Pegando carona com o discurso presidencial de "Nunca antes na história deste país...", imagino que esteja tentando reproduzir quiçá a mesma ideia. Mas, a meu ver, o que está velado nessa propaganda é um discurso que só faz ratificar o preconceito em relação ao baiano... Ora, como "nunca se trabalhou tanto na Bahia"? Isso quer dizer que só depois deste governo é que a gente resolveu pegar no batente?

Pelo que eu saiba, o conceito de emprego é diferente de trabalho. Suponho que seja evidente para todos. Eu, por exemplo, já estive desempregada várias vezes, mas nunca fiquei sem trabalho. Nunca deixei de trabalhar. E sei de muita - mas muita - gente que está fora das listas de pagamento carimbadas, no entanto, de forma oficiosa, acorda bem cedo e sua de sol a sol, enquanto outros estão a se esbaldar, sobretudo os que aproveitam o melhor da indústria cultural e turística baiana. Agora vem um publicitário e me diz que nunca se trabalhou tanto por aqui... Talvez ele não seja baiano! O pior é que alguém leu, ouviu e concordou com a peça, assinando embaixo antes de veiculá-la, né?

Eu fico, às vezes, um pouco revoltada com o fato de nos alimentarmos de dizeres como esse e assimilar sem refletir os discursos que acabam sendo transmitidos. Imagino que a percepção de muita gente passa ao largo. E, assim, com a intensa reprodução midiática, vamos emprenhando nossos ouvidos e línguas com informações aviltantes!

Pare e pense: o que você entendeu ao ler ou ouvir esse anúncio?

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quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Nizan, o favelão e o careca.

Recebi uma notícia por email e resolvi comentar.

Antes de qualquer coisa, já reparou como os comentários de twitteiros só rendem assunto quando depreciam ou ridicularizam a si mesmo e aos outros? O pior é que tem sempre um 
sensacio(jor)nalista de plantão, caçando míseras notícias (ou desinformações), a fim de dar eco a polêmicas inúteis.


E cá vou eu entrar no jogo das discussões vãs, embora alheia e avessa a ampliar esse tipo de lero-lero. Mas eu me senti cutucada a comentar sobre o que 
Nizan Guanaes ¾ acompanhado de seus ricos predicados publicitários e mais de 15 mil seguidores do Twitter ¾ comentou acerca de Salvador, sobrando farpas de ataque até em Bell Marques, vocalista do Chiclete com Banana. Não quero ser advogada aqui, mas sim, provocadora de apenas duas reflexões:


Primeiro, segundo a 
matéria, Guanaes chama a orla soteropolitana de "favelão"... Ora, se assim lhe parece, talvez ele preferisse que os favelados frequentassem São Tomé de Paripe, enquanto a maravilhosa orla fosse desfrutada pelos turistas, para os quais a Bahia é vendida em suas peças publicitárias! Essa qualificação cunhada pelo famoso publicitário me parece até comentário à moda Boris Casoy... E, afinal, por que o espaço público não pode ser utilizado pelo público, hein?

Segundo, o que ele tem a ver com a careca de Bell? Aliás, como bom profissional, deveria entender que a bandana, mais do que artifício de vaidade pessoal, é uma marca do produto do Chiclete com Banana... Eu não sou publicitária e sei disso! Ademais, se Nizan Guanaes pôde fazer cirurgia bariátrica para ficar mais enxuto e elegante, por que Bell não pode usar bandana e peruca para lidar com a calvície?

Caetano fez escola...
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