terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Salvadortown


Do que você precisa para morar bem? Casa, comida e roupa lavada? Tsc, resposta errada.

Quem anda por Salvador já deve ter percebido centenas de outdoors, panfletos e peças publicitárias em diversas mídias (impressas, radiofônicas ou televisivas) sobre o melhor lugar para se viver. Seja morando, trabalhando, comprando e se divertindo apenas acessando o elevador ou virando a esquina, seja num supercondomínio num novo bairro a ser criado ou seja naquele bairro em que você sempre sonhou. As possibilidades são várias.

Outro dia, por exemplo, recebi um panfleto que trazia nada mais nada menos do que 27 itens compondo um projeto condominial em Alphaville; sem falar no pé-direito duplo no andar térreo ou nos ¾ com suítes reversíveis. Lá estava escrito, para o meu bem-estar, conforto e segurança:

1. portaria;
2. port-cochere;
3. equipamento de ginástica ao ar livre;
4. redário;
5. espaço de meditação com fonte;
6. área externa integrada ao salão de festas;
7. salão de festas e espaço gourmet;
8. salão de festas infantil;
9. brinquedoteca;
10. hall social;
11. playground;
12. praça de leitura;
13. churrasqueira;
14. quadra recreativa;
15. spa/solarium;
16. piscina climatizada com raia de 25m;
17. deck molhado;
18. piscina infantil;
19. espelho d'água;
20. sauna com ducha circular;
21. spa;
22. fitness;
23. sala de massagem;
24. lan house;
25. garage band;
26. praça juvenil;
27. estacionamento para visitantes.

Ufa... cansei! Mas alguém pode me explicar o que é port-cochere? Redário? Existe hall que não é social? Spa/solarium, fitness, lan house, garage band? Avisem aos publicitários que eu falo português!

E você pensa que os estrangeirismos param por aí? A melhor parte está nos nomes dos empreendimentos: “ForestVille”, “AlphaPark Lifestyle”, “GardenVille”, “Mandarim Salvador Shopping”, “Mundo Plaza”, “Le Park”... Haja língua para embolar e french, chinese and american way of life para imitar!

Fico a me perguntar se tudo isso é necessário para ser feliz ou se, de fato, servirá apenas para suprir a falta de tempo dos pais e mães para com os filhos. Quem sabe essa sofisticação nos servirá para garantir a estranheza com os vizinhos ou, ainda, pode (tentar) nos poupar da insegurança dos espaços públicos de verdade, com gente de verdade.

Que vida é essa que não se pode viver, mas se pode comprar? Para onde foram os quintais, a brincadeira de amarelinha, o banheiro dividido e a negociação de canais para ver televisão? Já não há mais espaços para o simples nem para a coletividade.

Então, depois de pensar no que eu preciso para viver bem, decidi que quero fugir para longe daqui. Para Pasárgada. Para ÔmegaVille.



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4 comentários:

  1. Mais uma vez, parabéns!!
    Eu tb quero ir para Passárgada... ops... pata ÔmegaVille. risos
    Nine, estava eu comentando hj sobre o assunto. Não temos mais infância, já nos tolheram tudo. Resomumo-nos a somente "Play Groud". Claro mais um estrangeirismo.
    As crianças hj convivem muito bem com computadores, video games e, às vezes, o maldito "Play". Um outro ambiente de encontro com amiguinhos é na escola, mas nas ditâncias as quais se compromete uma capital como Salvador, é quase que impossível uma relacionamento mais íntimo, uma AMIZADE.
    Difícil, mas pensar no que vivi na infância, realmente, é de dar inveja. Por isso que quando conto os "causos" da minha infância, muitos para pra ouvir.
    Acho que vou me preparar para dar palestras em "Work Shop".

    Beijos

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  2. Dias desses tava discorrendo sobre o assunto...você anda pelas ruas e não vê mais guri...Se eu ver algum brincar de esconder ou coisa parecida, vou pedir pra brincar também...

    Por essas e outros que agradeço por ter a Deus por não ter sido um "garoto criado em playground"...

    E viva a MESA AZUL!!!

    Se algum empreendimento criar um espaço deste irá liderá as vendas...

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  3. Nine,
    nem fale...pense em contando os dias para ir para Ilhéus....

    A propósito da análise, penso se as pessoas terão tempo para usufruir todas essas coisas. Ou se não, só ficarão no playground dos prédios, fazendo uma via sacra nos mil e um itens de lazer!

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  4. Nine, blz, incrível seu texto. parabéns. pensar sobre isso é divagar em ondas muito antigas na nossa civilização brasileira. há um bom tempo que tentamos e impomos a cópia do estrangeiro,pois acreditamos que programa de índio é coisa negativa. mas um bom banho de cahoeira ainda tá valendo, pra carambolas. nessa sensação semelhante a tua um dia destes escrevi:
    "Somos todos loucos,
    nos encontramos um pouco
    para amenizar a vida,
    depois vamos embora
    cada qual no seu canto
    pra começar de novo
    a emaranhar as vias."
    beijos, sucesso e saúde.

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